Parkinson de "A - Z" é uma área reservada para a publicação de textos, ideias e contribuições relacionadas ao Parkinson e outros Distúrbios do Movimento e sintomas associados (tremores, distonias, tourette e dor). Os pacientes que buscam tratamento nesta área especializada da Neurologia, assim como seus familiares e cuidadores, seguidamente têm dúvidas e questionamentos a fazer. "A - Z" é um espaço para a apresentação, análise e informações relacionadas ao interesse de todos. Agradecemos a participação dos leitores.

Longevidade, memória e outras funções cognitivas
O medo, o perigo e o risco
A relação entre o tremor parkinsoniano e a ansiedade
Parkinson – uma nova versão de empatia?


Longevidade, memória e outras funções cognitivas


A longevidade que todos desejamos nos coloca diante da preocupação e do risco de declínio cognitivo: perda de memória e de outras funções mentais da mesma importância. A perda cognitiva maior e mais temida é a demência. Dados atuais da OMS estimam em 50 milhões o número de pessoas afetadas em todo o mundo. E com possibilidade de aumentar três vezes, até 2050.
(Fonte: Martine Lochouarn, publicado em 31/05/2019.)

Na doença de Alzheimer, a memória é a função mais comprometida. Até agora não existe tratamento preventivo. Alguns medicamentos possibilitam alívio temporário dos sintomas. O Alzheimer é a doença neurodegenerativa mais comum em todo o mundo, mas não é o único risco que existe. O déficit cognitivo de origem vascular é uma situação de forte significado, com elevada prevalência e o risco de produzir sequelas graves. Assim, também, seus fatores predisponentes: hipertensão arterial, diabetes, sobrepeso e obesidade, tabagismo, sedentarismo*, estresse e outras doenças que podem ser evitadas e são situações tratáveis.

O déficit cognitivo de origem vascular se expressa principalmente pelo comprometimento cognitivo das funções executivas: déficit de atenção, da tomada de decisões, do raciocínio mais complexo; dificuldades para associar dados, raciocinar, resolver problemas, planejar e executar. Ou seja, compromete o processo de “parar e pensar, antes de fazer”.

Observações de Neurologistas de Dijon e Lille, na França, citado pelo dr. Didier Leys, 2019: os avcs isquêmicos, consequências das doenças vasculares cerebrais e seus fatores predisponentes, podem ser grandes ou pequenos. Os primeiros são quadros graves, emergências. Já os avcs pequenos, seguidamente passam despercebidos e mais tarde evidenciados quando se realiza uma ressonância magnética cerebral. 30% dos avcs, grandes ou pequenos determinam o envelhecimento cerebral precoce e produzem algum grau de déficit cognitivo. Um paciente pode ter Parkinson e doença Vascular cerebral.

Na doença de Parkinson, perdas cognitivas podem ocorrer em graus variáveis e associados a fases da doença. Na prática do tratamento neurológico observa-se que ocorrem sintomas de déficit cognitivo depois de vários anos de evolução da doença. Ou seja, perda cognitiva não é um sintoma inicial. Um estudo multicêntrico, tendo entre os autores Christopher Goetz e Eduardo Tolosa, publicado em 2007, referente a “critério diagnóstico para demência associada ao Parkinson”, comenta que o ponto de prevalência se aproxima de 30% e que idade avançada e a forma “rígido-acinética” dos sintomas, são associados a risco maior de demência. Indispensável, portanto, que todos os casos tenham sido estudados pelo Neurologista e o diagnóstico de Parkinson confirmado. Lembrar sempre: aqueles fatores que aumentam o risco de doença vascular cerebral, acima mencionados, podem estar presentes em casos de Parkinson. Este não deve ser o problema majoritário e único: a saúde deve ser cuidada integralmente.

Outros “parkinsonismos”, situações que compartilham com a doença de Parkinson alguns sintomas motores e que são doenças diversas, podem apresentar comprometimento cognitivo já no início. Tais são os casos, entre outros, das doenças de corpos de Lewy e Huntington.

O capital cognitivo humano pode ser protegido com cuidados e a obediência ao melhor tratamento possível. Vários medicamentos aliviam os sintomas do Parkinson, assim como o tratamento cirúrgico e outras terapias complementares. A grande maioria das pessoas sabe da multiplicidade de recursos disponíveis para tratar as causas e destinados a evitar, amenizar ou retardar o aparecimento das doenças vasculares cerebrais.

*Ps – para os parkinsonianos, mover-se, praticar exercícios, caminhar é fundamental. “eu não sou sedentário”, dizem alguns praticantes da única caminhada de fim de semana. Enganam-se. Para não ser sedentário, mova-se diariamente, de preferência informe-se e siga um adequado programa de atividades físicas.


O medo, o perigo e o risco


Para a pessoa previamente sadia, a percepção dos primeiros sintomas passa a ser uma marca histórica na biografia de cada um, corroborado pelas observações de familiares e outros. Diante de um tremor, leigos em geral arriscam sem perder tempo: “isto deve ser Parkinson...”. Comentários que se somam às preocupações pessoais do paciente e logo percebe que não tem como evitá-los. O tremor simplesmente comparece, sem prévio aviso. James Parkinson, lá no londrino e distante 1817, deve andar ainda mais flegmático por causar tanta preocupação e medo nas populações.

Vive-se com medo. O ar poluído, alimentos contaminados, pesticidas, insegurança, etc. Muito tem fundamento. Outro tanto é semeado diariamente para manter a informação de conteúdo catastrófico ou a fim, associado ao rito “Good news are no news” (boas notícias não são notícias, não interessam). Este é o jogo e a moldura que mais se vê. Sem o devido cuidado, chega-se à panfobia, que é o medo de tudo, quando se perde muito de racionalidade. Para aqueles que apresentam os primeiros sintomas, assim como para os demais parkinsonianos, os perigos e riscos de ser portador, serão substancialmente amenizados, com a adoção de duas medidas:

A. Assegure-se de um diagnóstico correto
B. Escolha um neurologista para orientar todo o seu tratamento.


A relação entre o tremor parkinsoniano e a ansiedade


A maioria dos pacientes comentam que os tremores pioram em situações de ansiedade. Manifestações de ansiedade ocorrem em 67% dos pacientes com Parkinson. Muitos estudos reconhecem este percentual, mesmo que não se caracterize uma doença ansiosa específica. Importante considerar o que se denomina de “distúrbio de ansiedade social”, de alta prevalência em pacientes com Parkinson e que ocorre quando participam de atividades sociais, ou comunitárias, em contato com terceiros. Nestas situações, o paciente passa por uma experiência que tem duas vias: as manifestações de ansiedade crescem, quando participam de eventos e é indispensável a interação social. Se a ansiedade aumenta, os sintomas do Parkinson são potencializados, aumentando o tremor. Por outro lado, a piora motora resulta numa autoavaliação negativa, constrangedora, o que aumenta a ansiedade.

Alterações do sono, dor, ansiedade e depressão são alguns dos denominados “sintomas não motores” da doença de Parkinson. Considerando-se o Parkinson, doença que compromete os movimentos e, em paralelo, a ansiedade, a qual seguidamente associa-se à depressão, tem-se duas manifestações correlacionadas.

Sabe-se que entre as estruturas e funções do cérebro humano, relacionadas com o Parkinson e a produção dos tremores, pode-se mencionar a maioria das áreas corticais, os gânglios da base e o tálamo, o locus cerúleo e partes do cerebelo. É muito importante verificar que estas mesmas áreas estão, também, diretamente associadas com a produção dos sintomas de alterações do humor e da ansiedade. Esta associação neurofisiológica tem considerável repercussão nos sintomas parkinsonianos e corrobora a influência da ansiedade e outras manifestações não motoras sobre o tremor e sua intensidade.

A ansiedade e os fatores que contribuem para exacerbá-la, multiplicam os tremores. Cabe ao paciente, seus familiares e cuidadores estabelecer uma seleção de condutas e cuidados que possibilitem ao mesmo preservar-se, tanto quanto possível, de situações geradoras de ansiedade, stress e de desgaste emocional.

Falando em preservar-se e ou cuidar-se, verbos tratados e praticados com descaso, negligenciados. Parâmetros e programas de vida adotados e praticados pelas pessoas parecem priorizar o que é menos saudável e mais adverso ao bem-estar emocional. É extensa a lista de tais situações e o espaço não se presta a analisá-las. No entanto, quando consideramos “fatores ansiogênicos”, genericamente, existe uma trilha, comum a todos nós, fortemente consolidada, frequentadíssima, reconhecida combinação do bem e do mal: a “família internet”:

AS INFORMAÇÕES ÚTEIS + INTERCÂMBIO CIENTÍFICO
VERSUS
FACE + INSTAGRAM + TWITER (Redes Sociais)

Da parte boa, os benefícios são cristalinos. Da outra parte e estamos falando de ansiedade, de fatores de desestabilização emocional, ansiogênicos, atualmente as pessoas são tocadas e sofrem forte influência de quatro formatos totalmente diversos de informação:

- A informação real, fato, verdade
- A informação virtual. Ou seja, sem efeito real, algo latente, ou podendo ter a faculdade de vir a existir ou acontecer
- Quantidade imensa de comentários, imagens e informações inúteis e até relacionadas a crime
- O fake, que é uma informação falsa, nada a ver com a realidade, mas que rouba tempo e atenção das pessoas e as transporta para um plano de desorganização do estado emocional e até cognitiva. A informação fake é amplamente compartilhada na internet e as chamadas redes sociais, seu paraíso.

REFERÊNCIAS, LEIA MAIS:
1. M Chagas, T Oliveira, V Tumas. 2017. Can anxiety increase tremors in patients with Parkinson’s disease? An experimental model. Arch. Clin. Psyquiatry (S. Paulo)44: 4
2. A Storch, 2013. Nonmotor fluctuations of Parkinson’s disease: severity and correlations with motor complications. Neurology, 80:800-9


Parkinson – uma nova versão de empatia?


O título “empatia” refere-se à habilidade para inferir e compartilhar experiências emocionais com outras pessoas e deve ser um componente normal de nosso funcionamento social. Portanto, é a habilidade de reconhecer emoções e elaborar respostas aquele ou aos indivíduos que nos cercam. Empatia depende de perceber e adequadamente reconhecer as necessidades do outro. Um tipo de espelhamento sensorial: algo parecido como ver-se no outro. É tema relevante, tanto que autores ingleses criaram o verbo “empatizar”, referindo-se esta habilidade e suas variações entre os indivíduos. No nosso caso, o Parkinsoniano e as pessoas com quem convive. (Vale citar o texto de M.Martinez, publicado em Front Aging Neurosci,2018).

Um pequeno intervalo é oportuno. Estamos falando de percepções e emocionalidades, áreas de considerável complexidade, de trânsito não muito fácil, para os atores da população em geral. Empatia resulta de um funcionamento neuropsicológico sadio, “descontaminado”. Tem a ver com ética. Não combina com interesses e opõe-se a egoísmo. Mesmo que tenhamos que concordar com o intelectual e escritor.

Argentino Ernesto Sabato (1911-2011), quando disse “o coração de qualquer mortal é um conjunto de contradições”, o propósito e o exercício da empatia deve considerar-se acima, tem a ver com solidariedade, deve ser um objetivo pessoal e social, é necessário e correto.

Um percentual considerável de Parksonianos, depois de vários anos de doença e do sofrimento imposto, pode apresentar graus variáveis de déficit neuropsicológico. Com isto, perdem a competência para detectar e responder adequadamente ás emoções. Perdem parte da capacidade de perceber e valorizar as necessidades das pessoas com as quais convivem. Perdem parte de funções importantes do processo de empatizar. Os especialistas no tratamento do Parkinson consideram esta perda parcial de empatia, como um sintoma não-motor, apresentado pelos pacientes, o qual impacta sobretudo nas relações com os cuidadores e familiares. É necessário que estes tenham a compreensão desse processo, que isto faz parte da doença, não é proposital e de certa forma ”é uma nova versão de empatia”.